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Kirill Nazarenko: Como se tornar milionário no Caribe?
Kirill Nazarenko: Como se tornar milionário no Caribe?

Você está lendo um artigo preparado durante o desenvolvimento do simulador de vida pirata Corsairs Legacy pelo estúdio Mauris, com o objetivo de popularizar a temática marítima em geral e os jogos de piratas em particular. Você pode acompanhar as novidades do projeto em nosso site, no canal do YouTube e no Telegram.

Neste artigo, Kirill Nazarenko conta como você poderia se tornar um milionário no Caribe.

Olá! Hoje vou falar sobre como se tornar milionário no Caribe.

Ser milionário nunca foi fácil e nós sabemos, pelo menos pela série “Black Sails”, que caçar tesouros era um negócio extremamente perigoso. Vamos primeiro ver como viviam as pessoas comuns, não piratas, e como era possível ganhar a vida sem ir ao mar e sem se dedicar à pilhagem marítima.

Kirill Nazarenko: Como se tornar milionário no Caribe?

Série “Black Sails”

Falando do Caribe, antes de tudo, é preciso entender como você chegaria a essa região. Primeiro era necessário vencer uma longa viagem da Europa até a América. Hoje você olha o horário dos voos, compra uma passagem e, em algumas horas, está num aeroporto do outro lado do mundo. No século XVII ou XVIII, porém, era preciso atravessar um longo e incerto trajeto marítimo.

Para imaginar quanto tempo podia durar a viagem até a América, vale olhar os números do trajeto de volta. Na Espanha, as estatísticas da Frota da Prata, que navegava do Caribe à Península Ibérica, eram bem registradas: a travessia mais rápida até a Europa levava cerca de 40 dias, e a mais longa, cerca de 160 dias, ou seja, mais de cinco meses no mar.

A velocidade de viagem podia variar mais ou menos nesse intervalo – dependia do clima e, sobretudo, dos ventos. Em parte, também dependia da habilidade do capitão: ele podia sair do “corredor” de ventos favoráveis, ou a tempestade podia empurrar o navio para fora desse corredor – e então a embarcação poderia ficar presa em uma zona de calmaria, praticamente parada.

Da mesma forma, era difícil contornar o Cabo Horn. Às vezes era possível fazê-lo em poucas semanas, mas havia casos em que se tentava contorná-lo por meio ano. Por isso até marinheiros modernos ficam nervosos quando passageiros perguntam: “Quando vamos chegar a tal porto?”. Eles respondem: “Vamos chegar”, mas evitam dizer em voz alta quando exatamente.

Ou seja, só para ir da Europa à América há 300 anos, você teria que viver a bordo de um navio por muito tempo. Durante todo esse período, precisava comer, pagar pela passagem, enfrentar tempestades e doenças. E, se você pensa que dava para viajar em uma cabine confortável, como num navio de cruzeiro moderno, provavelmente está enganado.

Kirill Nazarenko: Como se tornar milionário no Caribe?

Série “Black Sails”

Para viajar em uma cabine minimamente confortável, você precisava ser uma pessoa muito rica. Os navios da época não eram especializados: não havia navios de passageiros e cargueiros separados – a maioria era universal. Se fosse um navio mercante e você fosse muito rico, o capitão poderia ceder a você a única cabine na parte de ré, no convés superior. Nela, você teria algo em torno de 15–20 m² de espaço com cerca de dois metros de altura.

Claro que alguém tão rico quase nunca viajava sozinho – normalmente ia com alguns criados. Na prática, esses 15–20 m² tinham de ser divididos entre várias pessoas. Era possível pendurar uma cortina, separar uma parte como quarto, outra como “escritório”, e ainda um canto para os criados. Você poderia usar a latrina na galeria de ré. Em resumo, a viagem seria relativamente confortável. Mas isso não significava que você pudesse se lavar de verdade – era bem possível passar todo o trajeto sem um banho adequado. Os criados preparariam sua comida e, se você não sofresse de enjoo, comeria relativamente bem.

Se você não tivesse muito dinheiro, teria de se apertar no convés principal ou nas partes mais baixas e escuras do navio. Num navio mercante pequeno, isso significava normalmente o cockpit ou um convés baixo, ao nível da linha d’água, sem vigias (janelas). Ali, para os passageiros, separava-se um cantinho no qual se dormia na completa escuridão, e o dia era passado no convés, se o tempo ajudasse.

Num navio grande – uma fragata ou navio de linha – podiam existir cabines temporárias no convés de artilharia, em áreas sem canhões. Elas eram separadas por tábuas, e o passageiro tinha à sua disposição um portinhola de canhão, que funcionava como janela. Em bom tempo, podia-se abri-la e aproveitar a vista para o mar; em mau tempo, tinha que ser fechada – e voltava a escuridão total.

Se você tivesse pouquíssimo dinheiro, o único modo de chegar ao outro lado do mundo, se fosse homem, era se contratar em um navio “por comida” como ajudante para todo tipo de serviço pesado. Em troca, recebia alimentação e um lugar para dormir. O costume de dormir em redes ainda estava se espalhando, e nem todo marinheiro tinha uma. Muitas vezes dormia-se simplesmente nas tábuas do convés, com algum trapo por baixo ou nem isso. Nesse caso, provavelmente você passaria o trajeto inteiro sem se despir, muito menos se lavar.

se você fosse mulher ou criança, ainda assim teria de “pagar” pela viagemem dinheiro ou, como se dizia de forma brutal, com o próprio corpo. Em qualquer caso, era uma prova duríssima.

Havia ainda outra forma de chegar ao Caribe: você podia se comprometer como servo por contrato (indentured servant). Isso significava que algum rico pagava a sua viagem em condições mínimas de conforto e, em troca, você teria de trabalhar para ele de graça, apenas por comida e abrigo, durante 3 a 7 anos. Foi assim que o famoso capitão pirata Henry Morgan chegou ao Caribe. Ele trabalhou durante anos como aprendiz de cuteleiro. Tudo dependia de em que tipo de patrão você cairia – um mais humano ou um tirano. E ainda era preciso sobreviver àqueles 3–7 anos.

Kirill Nazarenko: Como se tornar milionário no Caribe?

Capitão pirata Henry Morgan

Também era possível chegar à América graças a benfeitores, especialmente se você pertencesse a alguma seita ou grupo religioso, por exemplo, os quakers. Quakers ricos podiam financiar a viagem de seus correligionários para a América. Nesse caso, porém, você acabaria mais provavelmente no território do que hoje são os Estados Unidos, não exatamente no Caribe. A ideia era que você se dedicasse à agricultura e vivesse em comunidade com os quakers.

Claro que você também podia ser deportado para a América como punição. Em “As Aventuras do Capitão Blood”, de Sabatini, todos lembramos que o tribunal podia trocar uma pena de prisão pela venda do condenado como escravo nas plantações caribenhas. Esse escravismo era temporário, não vitalício: a duração do serviço era determinada pela sentença. O problema era sobreviver até o fim desse período.

Outra opção era ir ao Caribe como escrivão ou funcionário de um rico comerciante, ou – melhor ainda – como filho desse comerciante, enviado para cuidar dos negócios. Ou ainda como alguém que fizera fortuna na Europa e vinha ao Caribe investir na economia de plantações. Mas nós estamos analisando o caso de como se tornar milionário “a partir do nada”.

Lembro de uma anedota sobre um milionário americano do século XX. “Cheguei aos Estados Unidos com apenas um dólar no bolso”, conta ele. “Comprei um quilo de maçãs sujas, lavei no rio Hudson e vendi por 2 dólares. Depois comprei 2 quilos, lavei e vendi por 4 dólares…” Nesse momento o jornalista pergunta: “E foi assim que o senhor fez seu primeiro milhão?”. “Não”, responde o milionário, “depois disso eu recebi uma herança”. A moral é simples: fazer um milhão literalmente do zero é quase impossível. Claro que existem casos assim, mas talvez seja mais fácil ganhar na loteria.

Vamos então analisar nossas possibilidades reais no Caribe no fim do século XVII e início do XVIII.

Suponhamos que já chegamos ao Caribe. É preciso viver de alguma coisa, então você precisa arrumar trabalho. Tudo depende das suas habilidades. Se você era um artesão treinado na Europa, podia se empregar como ajudante num ateliê da sua área e, em poucos anos, juntar dinheiro suficiente para comprar suas próprias ferramentas e abrir sua oficina. Esse era provavelmente o caminho mais comum para quem chegava ao Caribe com um “ofício nas mãos”.

Se você fosse marinheiro, poderia se empregar facilmente em navios que navegavam pelo Caribe. Um marujo experiente também era muito valorizado a bordo de um navio pirata – suas habilidades eram essenciais ali.

Se você tivesse algum tipo de instrução, especialmente ligada à navegação e à arte náutica, sua carreira estaria quase garantida. Você poderia se tornar assistente de piloto (imediato) e, depois, piloto ou capitão de navio mercante. Lembrando que capitães de navios mercantes – socialmente pouco prestigiados e que costumavam começar como simples marinheiros – eram chamados de “skippers”. Se fossem alfabetizados, podiam aprender com outros skippers e seus assistentes a determinar a posição do navio observando sol, estrelas e planetas.

Devemos lembrar que determinar a posição exata do navio era muito difícil. O cronômetro marítimo foi inventado apenas na segunda metade do século XVIII, e antes disso não havia como saber com precisão onde exatamente, entre Londres e Barbados, o navio se encontrava. Sabia-se apenas que estava “em algum ponto no meio”. Na marinha de guerra, os cronômetros passaram a ser amplamente usados apenas nos anos 1780, e no tráfego mercante só no século XIX, pois eram caríssimos e exigiam habilidade para manuseio. Era preciso calibrá-los, fazer verificações constantes.

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Cronômetro marítimo

Já a latitude – posição em relação ao equador – era bem mais fácil de determinar. Isso se fazia medindo a altura do sol ao meio-dia em relação ao horizonte. Mesmo com instrumentos rudimentares, era possível calcular aproximada­mente essa posição. A partir daí, o navio podia ser colocado num rumo paralelo ao equador, que levaria ou ao mar do Caribe, ou de volta à Europa. Depois, bastava esperar o vigia gritar “Terra à vista!”.

Já que falamos em navegação, vale lembrar que barômetros ainda eram raros nos navios. Apenas na virada do século XVIII para o XIX é que entraram de fato no arsenal dos marinheiros, e mesmo no início do século XIX quem sabia usá-los era considerado um grande especialista, pois podia prever o tempo. A queda da coluna de mercúrio significava tempestade em cerca de um dia; a subida, o fim próximo da tempestade. No transporte mercante, o uso massivo do barômetro só começou em meados do século XIX.

Antes disso, os capitães confiavam em intuição e experiência, que substituíam muita teoria. Se você tivesse experiência, soubesse ler e escrever, conseguisse medir a altura do sol ao meio-dia e interpretar mapas, já possuía habilidades que permitiam agir com segurança como skipper de um navio mercante e rapidamente se destacar dos marinheiros comuns.

Num navio pirata, você também subiria rápido, podendo se tornar navegador ou imediato (quartermaster), que, entre outras funções, cuidava da partilha do saque. Se, além disso, você fosse corajoso e fisicamente forte, seu futuro estaria praticamente assegurado. Mas se a alfabetização não fosse o seu ponto forte, tudo ficava muito mais complicado.

Se você não tivesse um ofício nas mãos, seu “corredor de oportunidades” era bem estreito. Podia tentar se empregar como aprendiz de algum artesão, mas se já tivesse por volta de 20 anos ou mais, seria difícil, porque os aprendizes costumavam ser meninos jovemzinhos, tratados a gritos e, às vezes, a bofetões. Um rapaz de 20 anos podia revidar – e aí seria imediatamente expulso.

Outra opção era trabalhar como jornaleiro, mas esse era o degrau mais baixo da escala social urbanatrabalhador não qualificado com salário muito pequeno. Na França do século XVIII, por exemplo, um jornaleiro agrícola recebia algo como 4–5 táleres (piastres) por mês.

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Táler

À primeira vista, não é tão pouco, já que o piaster era uma moeda de prata contendo 27,2 g de prata pura. Com a liga, pesava cerca de 30 g. Pelo preço moderno da prata, isso parece pouco – algo como US$ 19 por piaster. Mas calcular o valor pela prata é enganoso; o correto é converter pelo ouro, pois a proporção ouro/prata era bem diferente. Hoje é em torno de 1:80; no século XVIII, cerca de 1:15, e no início do século XVI, algo como 1:10.

Convertendo ao ouro, um piaster de fim do século XVII equivaleria a cerca de 2 g de ouro, o que hoje seria algo em torno de US$ 110–120. Uma quantia razoável. Mas é claro que qualquer conversão direta entre dinheiro de séculos passados e moeda atual é apenas aproximada. No século XVIII não se comprava lâmpada elétrica, smartphone ou máquina de lavar – eles simplesmente não existiam.

Por outro lado, os tecidos eram relativamente mais caros do que hoje, porém as roupas duravam muito mais. Um casaco de lã grossa podia servir por vários anos. Ele era consertado, limpo e, por fim, desmanchado, virado “do avesso” e refeito, reposicionando botões e fechos. Assim, um pobre podia usar o mesmo casaco durante 5, 7 ou até 10 anos, se o tratasse bem.

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Casacos e outras roupas masculinas do século XVIII

Para entender o que significava um salário de 4–5 táleres por mês, vejamos os preços dos tecidos. Um metro de pano de lã com cerca de 1,5 m de largura, mesmo o soldadesco e barato, custava entre 0,7 e 1 piaster. Ou seja, com o salário de um mês, dava para comprar tecido para uma jaqueta e uma calça. Mas você ainda precisava se alimentar e morar em algum lugar, e aqueles 4–5 piastres não incluíam comida nem moradia. Se o jornaleiro recebesse comida e abrigo em troca, o salário em dinheiro era ainda menor.

Às vezes, o jornaleiro recebia roupa velha como parte do pagamento. Mas, mesmo assim, não podia se dar ao luxo de mais de um conjunto novo de roupa por ano. E, se o usasse todos os dias e ainda trabalhasse pesado, em um ano aquilo virava trapo. Com esse dinheiro, dava apenas para uma alimentação bem modesta.

Para entender melhor como funcionava a economia, podemos olhar os preços de alguns produtos na Europa, sobretudo aqueles que sustentavam a economia caribenhaaçúcar, café, corantes, em parte o tabaco e o arroz.

Em Amsterdã, no início do século XVIII, com um piaster compravam-se de 3 a 7 libras de café, ou seja, de 1 a 2 kg, dependendo da qualidade. O café árabe trazido pelos turcos era considerado o de melhor qualidade, enquanto o café do Caribe era visto como inferior e, portanto, mais barato. Assim, um piaster equivalia a 1–2 kg de café na Europa, mas no Caribe essa quantidade custava dez vezes menos. Bastava plantar os cafezais e ter escravos suficientes para a colheita.

Os escravos eram baratos: um escravo africano no Caribe custava cerca de 12 táleres (12 piastres). Ou seja, uma pessoa valia ali o equivalente a 12–24 kg de café na bolsa de Amsterdã. Naturalmente, o custo de mão de obra para produzir o café era baixíssimo.

Já o açúcar bruto (na forma em que era exportado para a Europa) podia ser comprado por cerca de 1 táler a cada 8 kg. Convertendo isso ao preço de um escravo, temos que 100 kg de açúcar bruto equivaleriam ao valor de um escravo. O açúcar refinado custava de 2,5 a 3 vezes mais.

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Escravos africanos trabalhando em plantação de açúcar

Refinar o açúcar era um processo complexo. Ele era passado por um filtro feito de osso queimado e moído, o que lhe dava cor clara – amarelada ou quase branca – e removia impurezas. Em regra, o açúcar refinado era produzido na Europa, atividade muito lucrativa, enquanto das colônias vinha principalmente o açúcar bruto.

No caso do arroz, podiam-se comprar cerca de 15 kg de arroz por um táler na Europa, e bem mais do que isso no Caribe.

Outros preços interessantes: uma garrafa de champanhe no século XVIII custava cerca de 2/3 de piaster, então com 2 piastres compravam-se 3 garrafas – um vinho muito caro. Por outro lado, um macaco podia custar cerca de 25 táleres na Europa, ou seja, dois vezes mais do que um escravo no Caribe. Isso mostra bem a diferença relativa de valores.

O queijo parmesão, tão apreciado pelos personagens de “A Ilha do Tesouro”, custava cerca de 2/3 de piaster por quilo, mais ou menos o mesmo que uma garrafa de champanhe. Apenas os ricos podiam se permitir champanhe e parmesão. Já um queijo holandês comum era 3–4 vezes mais barato.

Quanto às armas, não eram tão caras. Uma lâmina de espada sem empunhadura nem bainha custava cerca de 1 táler. Era uma peça de qualidade razoável – não aço de Damasco, claro, mas suficiente para se lançar à pirataria. A empunhadura e a bainha custariam mais 1 piaster, mais ou menos. Assim, uma espada pronta para uso custava uns 2 piastres na Europa. No Caribe, talvez algo em torno de 3–4 piastres. Ou seja, era mais barato comprar uma espada do que até um escravo “barato”.

Se falamos em como se tornar milionário, surge a pergunta: como sair da condição de jornaleiro ou aprendiz e reunir um capital inicial? Não havia receita nem naquela época (e eu também não darei uma), mas você podia tentar pegar dinheiro emprestado e iniciar um pequeno comércio. O problema era: quem emprestaria para um pobretão recém-chegado da Europa?

Primeiro, era preciso arrumar roupas decentes. Em seguida, convencer algum rico a lhe emprestar dinheiro. Como a população das ilhas era pequena, todos mais ou menos se conheciam, e era fácil levantar informações a respeito de alguém. Se os conhecidos do potencial credor dissessem: “Ele é um Zé-ninguém que veio da Europa e conseguiu essas roupas boas sabe-se lá como”, dificilmente você conseguiria um empréstimo. Além disso, ninguém confiava apenas na palavra; era preciso oferecer uma garantia, um penhor.

De onde tirar esse penhor? Uma possibilidade era entrar como sócio menor de algum comerciante que enviasse mercadorias do Caribe à Europa. Se você tivesse sorte e o navio escapasse de tempestades e piratas, em alguns poucos embarques você poderia juntar um capital considerável, alugar um navio por conta própria, continuar lucrando, reinvestindo e, com o tempo, mandar construir seu próprio navio. Era uma boa ideia mandá-lo fazer nos estaleiros holandeses ou ingleses – no século XVII, especialmente os holandeses, já que a Holanda era o centro da construção de navios mercantes – rápida e barata. Na Inglaterra, construía-se mais devagar e mais caro. Podia-se encomendar, por exemplo, um navio de dois mastros, um brigue, e com ele comerciar pelo Caribe.

Kirill Nazarenko: Como se tornar milionário no Caribe?

Brigue de dois mastros

Lembre-se de que o comércio entre Europa, África e Caribe seguia, em geral, o formato do “triângulo”. O navio saía da Europa para a costa da África, onde embarcava um carregamento de escravos, entregando em troca pólvora, mosquetes, armas brancas e ferro em barras. As tribos africanas da costa estavam bem armadas e sabiam perfeitamente o valor das mercadorias europeias; elas capturavam outros africanos no interior do continente para vendê-los como escravos. As famosas “contas de vidro” existiam, mas eram só uma pequena parte do comércio.

Em seguida, com o porão cheio de escravos, o navio seguia para o Caribe, onde se vendiam as pessoas e se compravam açúcar, café, corantes, arroz, tabaco, para depois levar tudo de volta à Europa.

Entre esses produtos, o tabaco era especialmente valioso. Um libra de tabaco (o peso variava conforme o país, de 400 a 500 g) podia custar 1 a 1,5 táler. Na famosa história sobre o “mouro” (arap) de Pedro, o Grande, diz-se que o czar comprou o rapaz por uma libra de tabaco – algo perfeitamente plausível. Se um escravo no Caribe valia 12 piastres e uma libra de tabaco, 1–1,5 piaster, então por algumas libras de tabaco podia-se, sim, comprar um garoto ainda inapto para o trabalho. Para um adulto, talvez se falasse em oito libras de tabaco. Fumar era um vício caro, possivelmente mais caro do que hoje.

O hábito de fumar se espalhou justamente porque permitia demonstrar riqueza: você literalmente “colocava dinheiro em fumaça”. Uma libra de tabaco custava tanto quanto uma lâmina de espada ou uma garrafa de champanhe. Essa libra rendia algo em torno de 800–1.000 cigarros, o suficiente para um mês se a pessoa fumasse bastante. Usando cachimbo, consumia-se mais tabaco. Tabaco bom, sem misturas, era um luxo.

Na Europa, porém, o tabaco era frequentemente adulterado. Misturavam-se ervas diversas para baratear o produto. Na Holanda, por exemplo, surgiu o costume de adicionar cânhamo ao tabaco. Assim, os holandeses do século XVII fumavam algo próximo a uma droga leve, entrando num estado de semi-intoxicação – algo bem visível nas pinturas de gênero holandesas, cheias de fumantes e beberrões com ar sonolento.

Na mesma Holanda havia o costume de colocar aguardente na cerveja. Fumar tabaco puro de boa qualidade era, portanto, um verdadeiro luxo. Sem falar que existia também o costume de cheirar rapé – tabaco em pó, inalado pelo nariz –, algo considerado um hábito nobre. Até soberanos se entregavam a isso; por exemplo, Catarina II da Rússia cheirava rapé. Ela o fazia com a mão esquerda, para que a direita, oferecida aos cortesãos para beijos, não ficasse cheirando a tabaco. Fumar era, porém, quase exclusivamente masculino; se uma dama fumasse, era às escondidas. Mas cheirar rapé era socialmente aceitável para mulheres.

Se, depois de certo tempo, você conseguisse enriquecer com o comércio, poderia comprar uma plantação no Caribe, adquirir escravos e começar a produzir açúcar, café, arroz, tabaco ou corantes. Assim, era possível tornar-se uma pessoa muito rica. Mas, se falamos em “milionário” em termos literais, era quase impossível juntar um milhão em moeda corrente: um milhão de piastres era uma soma colosal.

Para comparação: o orçamento anual de um país desenvolvido como Grã-Bretanha ou França, no começo do século XVIII, ficava em torno de 35–40 milhões de táleres. É improvável que uma única pessoa tivesse um milhão de táleres em patrimônio privado. Porém, quem tivesse 100 mil piastres já seria considerado extraordinariamente rico para os padrões da época.

Em seguida surgia outro problema: o que fazer com tamanha riqueza? Na Grã-Bretanha, já era possível ser “apenas” um rico comerciante, porque as barreiras de classe estavam relativamente diluídas.

Na França, se você acumulasse grande fortuna, provavelmente teria de investir em um título de nobreza. Era preciso obter patente de nobre ou mesmo comprar um título para legitimar o status de homem rico. Um simples “burguês muito rico” era alvo de chacota – basta lembrar o personagem de Molière em “O Burguês Fidalgo”. Apenas um nobre, de preferência titulário, tinha o “direito” de viver realmente no luxo. O lado prático é que havia mecanismos para comprar título.

Na Itália, já no século XVII, o comércio de títulos era amplamente difundido. Podia-se pagar certa quantia a pessoas do círculo do Papa e receber um título, ou comprar o título de um nobre arruinado. Isso era considerado uma transação legal.

Na França a situação era mais complicada, pois o país era mais centralizado e organizado do que a Itália. Era preciso chegar à entourage do rei, com subornos, mas, se você tivesse dinheiro, não era algo impossível. Claro que a “verdadeira aristocracia” saberia que seu título fora comprado e que você não tinha ancestrais nobres, mas, de qualquer forma, isso permitia legalizar a fortuna e viver luxuosamente em Paris ou na província.

Na Espanha, era mais difícil ainda, pois havia menos oportunidades de negócio e a ordem nas colônias era mais rígida. Em geral, é mais fácil enriquecer rapidamente onde os impostos são mal cobrados; onde o sistema fiscal funciona bem, enriquecer depressa é muito difícil. Assim, havia menos fortunas “explosivas” nas colônias espanholas. Mesmo assim, alguns conseguiam enriquecer, especialmente quem já tinha algum capital inicial – em dinheiro ou em habilidades. Saber ler e escrever já permitia virar assistente de administrador, depois administrador de plantação, o que elevava bastante a posição social. O analfabetismo e a falta de um ofício, ao contrário, jogavam a pessoa para o pé da escala social.

Kirill Nazarenko: Como se tornar milionário no Caribe?

Servidão e dependência camponesa na Europa Oriental

Ainda assim, no degrau mais baixo de todos estavam os camponeses. Na maioria dos países europeus, eles viviam submetidos aos senhores de terras. Mesmo onde não havia formalmente servidão, a dependência dos camponeses em relação aos proprietários era muito forte. Em grande parte da Europa Oriental – Rússia, Polônia-Lituânia (Commonwealth), Hungria, leste da Alemanha, Boêmia – havia servidão formal e legal.

Mesmo em países como França, Itália ou Espanha, onde a servidão legal era mais fraca, os camponeses seguiam submetidos à jurisdição dos senhores, e não podiam simplesmente decidir ir para o Caribe. Ninguém deixaria um camponês abandonar a aldeia onde nascera e onde se esperava que morresse. Para isso, era preciso fugir – e, ao fazê-lo, quebrar laços jurídicos, o que tornava tudo ainda mais arriscado.

Claro que sempre houve aventureiros e sortudos que conseguiram fazer fortuna. Mas esses casos eram extremamente raros. A grande maioria dos que chegavam ao Caribe vivia como artesãos, marinheiros comuns, capatazes em plantações. No melhor dos casos, alguém se tornava administrador de uma grande plantação. Chegar ao nível de “milionário”, mesmo no sentido amplo da palavra, era algo muito difícil.

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